segunda-feira, 29 de outubro de 2018

LEIA EXCELENTE ENSAIO DO PROFESSOR PAULO LOBÃO




A SOCIEDADE DE CANSAÇO E A POÉTICA 
DA CONTEMPLAÇÃO DE HORÁCIO DÍDIMO

Paulo Lobão

As formas de violência multiplicam-se na sociedade contemporânea, roubando do homem o direito à existência plena. A opressão assumiu uma condição singular: a violência neuronal. Byung-Chul Han, importante filósofo contemporâneo, realiza um lúcido diagnóstico, no ensaio Sociedade do Cansaço, sobre a face dessa irascibilidade dos novos tempos. Segundo o filósofo, a sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais “sujeitos de obediência”, mas sujeitos de desempenho e produção. São empresários de si mesmos” (Byung-Chul Han, p.22).   A arquitetura da violência neuronal vincula-se ao excesso de positividade, causando no sujeito a saturação e a exaustão extrema como consequência de uma estrutura organizacional de desempenho, a mais nova forma de dominação. Os infartos psíquicos, conforme assinala o filósofo, são sintomas dessa nova ordem. A locução verbal “posso fazer” traduz, de forma precisa, a as exigências da sociedade do desempenho, o que superaquece a nossa capacidade de realizar. A resposta negativa às imposições dessa sociedade constitui um monumento ao fracasso, incutido por um conceito de negatividade, tornando o indivíduo refém do desempenho a ele exigido. Fracassar é um verbo estranho ao pensamento que ordena esse mecanismo de dominação. Assim a opressão vem de dentro, de uma autosabotagem. Quem não for capaz de atender as demandas sofre um processo de marginalização, pois a expressão maximização de resultados é o axioma que se instalou na cabeça do homem contemporâneo, arrancando-lhe o tempo de existir. Adoece-se por não se saber mais empregar o advérbio de negação “não”; morre-se por se dizer sempre sim ao não. Instrumentos de resistência a essa condição imposta pela sociedade do desempenho parecem escassear. A virtuose da contemplação, elemento fundamental para a construção da consciência, é um poderoso mecanismo para escapar desse labirinto alucinante. E sim, a literatura certamente é um território de resistência. Tome-se como exemplo a poética de Horácio Dídimo. Impregnada de um lirismo de contemplação, a poesia Horaciana revela-se como literatura humanizadora, atravessada pela esperança, permitindo ao homem uma imersão no silêncio que grita na comunicação dos arranjos linguísticos empregados pelo poeta. É uma poesia iluminada, provocadora e epifânica, construindo um grande repositório da existência. Some-se a toda essa inclinação reflexiva a inventividade formal, dialogando com as diferentes formas estéticas, o que lhe confere contemporaneidade, mas sem que lhe escape esse olhar mais profundo para nossas entrâncias e reentrâncias. Constrói-se, portanto, um caleidoscópio literário, firmado por seus inventos poéticos. Há um transbordamento da linguagem, cujo resultado é original e inusitado, permitindo ao poeta um livre trânsito entre as diferentes vertentes da poesia: desde as reflexões sobre o fazer poético até as inclinações surrealistas. A obra A palavra e a Palavra ilustra, de maneira contundente, as experimentações horacianas, definindo o poeta não apenas como um representante da moderna poesia brasileira, de clara adesão concretista, mas também como um poeta que consegue alcançar, por meio dos versos que escorrem de seus dedos, as dimensões mais profundas da alma humana, ressignificadas pela palavra divina, gerando a importância da espiritualidade frente à lamina cortante de uma nova ordem sosical que decepa sonhos e “declara à vida guerra”.  Não se esqueça aqui do pleno domínio do poeta no que concerne às possibilidades da gramática na sua riqueza polimórfica e plurissemântica, extraindo da dureza dos substantivos perfilados a dor de estar emparedado, representada pelo desespero de um murro e de um grito, resultante de desdobramento da palavra nas suas possibilidades estruturais e significativas. Observe o poema:

o emparedado

muro
muro
muro
muro
muro
(...)
muro m(urro)

A decomposição mórfica de um substantivo em suas unidades gráficas e fonéticas também serviu ao poeta como representação simbólica de uma existência efêmera, evocando no leitor uma consciência sobre esses tempos nebulosos. A analogia imagético-verbal aproxima a parca existência ao consumo do cigarro. A fumaça é o elemento representativo em contiguidade semântica com a vida frágil e fugaz. A severidade do tema ganha certos contornos de ironia no consórcio significativo entre os vocábulos “cinza” e “sarro”.  Se por um lado o sarro é a crosta marcante após o consumo do cigarro, por outro pode representar o ato peremptório de divertir-se de outrem.

a fumaça

cigarro
cigarr
cigar
ciga
cig
ci
c
cinza
sarro

A concisão da linguagem, uma conclusão unânime de ensaístas sobre a poética de Horácio Dídimo, fundamenta-se num elaborado e sofisticado domínio no manejo das potencialidades das palavras, arrancando-lhes possibilidades, às vezes impensadas, provocando no leitor contemplativo as mais inusitadas e lúdicas surpresas linguísticas e envolvendo-o no encantamento do fazer poético. No processo de substantivação dos termos “pouco” e “muito”, por meio da derivação imprópria, o poeta sentencia que a lição é dura, embora sensível: a importância do suficiente numa sociedade dos exageros e da extremada positividade. Assim, o termo “pouco”, de claro valor indefinido, ganha uma lógica de pretensa precisão, sofrendo uma ressignificação semântica ao apresentar a ideia da suficiência. Observe os versos:

o pouco pode ser o muito
disfarçado

             A poesia de Horácio edifica e renova as convicções humanas. Nessa “Roda viva” do cotidiano, em que caminhamos para as lonjuras do destino, a poesia de Horácio se impõe como mediadora da esperança em um mundo quase desesperado, resgatando-nos dos abismos da descrença e da negatividade, constituindo-se num espaço de contemplação e descobertas em meio a essa sociedade do cansaço de que nos fala Byung-Chul Han. É uma poesia engenhosamente arquitetada; uma grande festa da linguagem artística em suas formas, cores, texturas, sentimentos e reflexões. Essa comunhão mágica realiza-se pela plenitude lúdica da palavra. Eis o poeta da palavra que desfila densidades no exercício da inventividade; eis o poeta que retira do intervalo entre a palavra no papel e o silêncio da leitura as razões do seu ofício: aliviar o peso do mundo que acreditamos carregar.

Bibliografia
DÍDIMO, Horácio. A palavra e a Palavra. Fortaleza, Edições UFC, 2002.
HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Editora Vozes, 2017.
  

sábado, 20 de outubro de 2018

AJEB/CE COMEMOROU, EM ALMOÇO NO IDEAL CLUBE, ANIVERSÁRIO DE GISELDA MEDEIROS, SUA PRESIDENTE DE HONRA.

Evento acontecido no Ideal Clube, em 14 de julho de 2018


A Família


Ana Paula, Giselda Medeiros e Ricardo Caratti


Nirvanda Medeiros, Ana Paula Medeiros, 
a aniversariante, Révia Herculano,Gizela Nunes da Costa, Margarida Alencar e Norma.


A aniversariante e Conceição Seabra


Casal Margarida e Vicente Alencar, Giselda, 
Affonso Taboza e Nirvanda Medeiros


Vládia Mourão, Presidente Elinalva Oliveira,
Zinah Alexandrino, aniversariante e Maria Luísa Bomfim


Elinalva Oliveira, Giselda Medeiros, Vládia e Zinah.

sábado, 13 de outubro de 2018

Ajebiana Rosa Virgínia homenageia Hilma Montenegro, em seu centenário de nascimento.




Águas de Mim


Fico pensando em Hilma...                                                              
Tudo valeu a pena! Minha amiga,
Quão feliz estás nos céus!
Deus, por certo, deu-te asas para vir a Terra
No dia três de outubro.
Teu filho, Seridião, vestiu a alma
De um rubi tão puro e rubro
Que dos olhos do coração caíram lágrimas
Azuis das saudades de ti.
E tu em luz – ali –
Iluminante Estrela-Mãe!
Todos os teus filhos e netos no Palácio da Luz
Em corpo, em nome e palavras
No santo sinal da cruz
A família da tua lida – eternizada.
As amigas da tua alma, das escritas,
Ali contigo, na Esplanada da vida.
“Esplanada da Vida” nos roteiros de Deus.
Seridião, nobre filho amado,
Cruzou os portais do tempo sublimado.
Das esferas do Universo
Nasce a Música do silêncio dos dias ausentes de ti.
Essa saudade se fez palavras – Um livro –
Em jardins nos labirintos de sóis e luas de ti.
Obrigada, Princesa dos verdes mares,
Águas viajantes de mim.

Rosa Virgínia
13. out.2018

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

IMORREDOURAS SAUDADES, PROFESSOR GENUÍNO.

Morre o Prof. Genuíno Sales, um apaixonado pela Educação



Faleceu sábado passado, 29 de setembro, aos 80 anos, o Prof. Genuíno Sales, ocupante da cadeira nº 23 da Academia Cearense da Língua Portuguesa, entidade que presidiu em duas ocasiões: entre 1994 e 1998, e de 2006 a 2008. Genuíno era membro, igualmente, da Academia Cearense de Letras (ACL), onde ocupava a cadeira nº 9, e sócio correspondente da Academia Piauiense de Letras no estado do Ceará. O sepultamento realizou-se, às 18 horas, no Cemitério Parque da Paz.
Genuíno Francisco de Sales nasceu em Pedro II, Piauí, no dia 15 de abril de 1938. Bacharel pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, em 1966, graduou-se em Letras, pela Universidade Estadual do Ceará, em 2001.
Foi professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira de vários colégios de Fortaleza. Também atuou como Diretor de Ensino da Organização Educacional Faculdade Farias Brito. Em seu discurso de posse na ACL, confessou: “Profissional da educação – tenho aprendido no Ceará mais do que ensinado. Ousei tornar-me professor do ensino médio porque amo a educação da juventude – meu maior ideal – minha induvidosa vocação. Há 50 anos vivo a emoção da certeza de que quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. A juventude é a fase mais formosa da vida, é a vida no seu maior esplendor. A essência de todos os seus encantos. O vaticínio da perenidade do amor entre os homens.”
Poeta e contista, publicou os seguintes livros: Bem na safena, 2000; EntreMentes (poesias), 2003; Análise sintática (Caderno do Genuino), 2003; Os sertões, 2003; e Fins d´Água, 2005.
Prêmios, títulos e condecorações: I Concurso Ceará de Literatura, no gênero conto; título de Cidadão Cearense; Medalha do Mérito Renascença em grau de Oficial, do governo do estado do Piauí; Intelectual do Século, outorgado pela Prefeitura Municipal de Pedro II, Medalha do Mérito Cultural, conferida pela Câmara Municipal de Pedro II e notório saber pela Universidade Estadual do Ceará. Ingressou na Academia Cearense de Letras no dia 29 de junho de 2006, ocasião em que foi saudado pela acadêmica Giselda Medeiros.
A seguir, transcrevemos aquele que Genuíno, certa ocasião, considerou seu melhor poema:
PRESENÇA
Eu gosto de não te ver
para não sentir em vão
com tua presença esquiva
o pecado inevitável.
Eu gosto de não te encontrar
para não sofrer a tentação
do irrealizável.
Mas mesmo sem querer te vejo
e mesmo sem querer te encontro.
E se te vejo peco.
E se te encontro sofro
sofro e peco
porque a tua presença onírica
é a volúpia de minha solidão
na certeza do impossível
em que pulveriza meu sonho.

FONTE: http://aclp.com.br