DIANTE
DO PRÍNCIPE ADORMECIDO
Giselda
Medeiros
A sala inteira condoía-se.
Ao seu centro, ele, silenciada a voz,
olhos cerrados ao mundo. O peito cheio de quimeras (que, ainda, não haviam sido vividas) já
não pulsava à presença da Amada, ali, olhando-o em seu último sono (Um
grande amor chegou. Por que morrer?).
Dorme o poeta, enquanto as musas, ao seu
redor, ninavam-lhe o sono e coroavam-lhe a fronte de louros. Querubins
celestiais, perfilados, esperavam a voz de comando para o conduzirem ao trono
majestático da Poesia Imortal, lá, nos siderais espaços inatingíveis aos
humanos mortais.
E o Príncipe, sereno, na embriaguez dionisíaca
do imponderável, pairava sobre tudo e sobre todos, iluminado por mansas
candeias, metáforas dos versos incandescentes.
O que diria o Poeta acerca de tudo isso
que se passava ao seu redor? Que poema comporia? Quais mensagens impregnaria em
nós, ali, pesarosos, aflitos por sua eterna ausência física? Talvez dissesse: Não
posso ser eterno. Sou tão pouco!
A sala, condoída, captava o som choroso
e sublime do violino que chorava por ele nos acordes de suas canções
preferidas. E ele parecia ouvi-las, em sua ausência, pois sentia-se-lhe o ar
circunspecto de quem se extasiava (como sempre acontecera) diante do Belo.
Não se ouvia, porém, o lamento do seu coração
inanimado, mas que ainda parecia sussurrar: Poeta e amante sendo, em mim o
sentimento / Deixou de ser maré ou ímpeto de rio.
Na sala, vozes se alteavam em cantos
litúrgicos, mãos se juntavam em preces silenciosas. Olhos deixavam verter, como
um veio d’água, lágrimas azuis, metaforizadas em saudade.
Ah, Poeta, nem viste a dor que nos
atormentava o peito, que nos deixava atônitos! Como viver sem ti, ó Príncipe,
que nos comandava, que nos incentivava, que nos acolhia?
E a sala viu (ah, como doeu!), quando
confinaram, para sempre, o teu modo solene, o jeito vago, naquele estrito espaço, que não era o teu
espaço, tua visão de mundo, teu trono majestático. Por que sentir as cousas
terminadas? Quem de nós poderia responder, Poeta?
A sala condoía-se...
E uma
interrogação pairava no ar: Por que partias, ó Príncipe, se a Primavera chegava
com suas perfumadas cores?
ARTUR EDUARDO BENEVIDES - O PRÍNCIPE DOS POETAS CEARENSES
ARTUR EDUARDO BENEVIDES
- Nasceu em Pacatuba, 25 de julho de 1923, filho de Artur Feijó Benevides e
Maria do Carmo Eduardo Benevides. Fez os preparatórios no Colégio São Luís e no
Liceu, bacharelando-se em 1947 pela Faculdade de Direito do Ceará. Bacharel em
Letras (1970). Presidiu o Centro Acadêmico Clóvis Beviláqua e a Sociedade
Acadêmica de Cultura Iniciou-seno jornalismo (“Correio do Ceará”, “Unitário”,
“O Povo”, “O Nordeste”). Um dos fundadores do Grupo Clã, de cuja revista foi
assíduo colaborador. Também escreveu em “Valor”. Professor Emérito da Faculdade
de Filosofia do Ceará. Diretor da Faculdade Católica de Filosofia. Professor
titular da Universidade Federal do Ceará. Dirigiu o Departamento Regional do
SENAC (Serviço de Aprendizagem Comercial) e o Centro de Estudos Brasileiros da
Universidade de Rosário (Argentina). Príncipe dos poetas cearenses, a partir de
1985. Foi Diretor da José de Alencar. Ocupou o cargo de Chefe da Procuradoria
da extinta LBA (Legião Brasileira de Assistência) no Ceará. Visitou grandes
universidades européias (Oxford, Colônia, Bonn, Sorbonne, Lisboa), em todas
colhendo observações práticas sobre currículos e orientação pedagógica.
Participou do 1 Congresso Internacional de Escritores, do II Congresso
Brasileiro de Escritores, dos Congressos Cearenses de Escritores e de Poesia.
Titular
da cadeira n° 40 (patrono: Visconde de Sabóia), coube-lhe a honra de presidir a
instituição no seu centenário, fazendo realizar programação comemorativa de
alto nível. Portador de numerosas condecorações e medalhas, entre elas a do
Mérito Cultural da Universidade Federal do Ceará, a Justiniano de Serpa (por
serviços prestados à educação), a José de Alencar (pelos serviços prestados às
letras e artes cearenses), a de Honra ao Mérito do SENAC (por sua colaboração à
melhoria do ensino técnico-profissional no Brasil) e a Cidade de Fortaleza
(concedida pela Câmara Municipal da capital cearense). Da Academia Cearense de
Língua Portuguesa, da Academia Cearense de Retórica.
Membro
correspondente da Academia Cearense de Ciências, Letras e Artes do Rio de
Janeiro. Sua bibliografia é valiosa, reunindo importantes premiações; estreou
em 1944 com os poemas de Navio da Noite; vieram depois Os Hóspedes (1946, em
parceria com Aluísio Medeiros, Antônio Girão Barroso e Otacílio Colares).
Outros livros de poesia: A Valsa e a Fonte (1950); Cancioneiro da Cidade de
Fortaleza (1953); O Habitante da Tarde (1958); O Tempo; O Caçador e as Cousas
Longamente Procuradas (1966); Canção da Rosa dos Ventos (1966);-O Viajante da
Solidão (1969); Vida de Andarilho (1974); Elegias de Outono e Canção de Muito
Amar e de Adeus (1974); Arquitetura da Névoa (1979); A Rosa do tempo ou o
Intérmino Partir (1981); Sonetos à Beira-Mar e Elegias do Espaço Imaginário
(1981), e Inventário da Tarde (1983), afora outros. Como ensaísta, publicou: A
Lâmpada e os Apóstolos (1982); Universidade e Humanismo (1971); Uma Vida a
Serviço da Cultura (1973); Idéias e Caminhos (1974); Evolução da Poesia e do
Romance Cearense (1976); O Tema da Saudade na Poesia Luso-Brasileira (1979);
Literatura do Povo: Alguns Caminhos (1980), e Camões - Um Tema Brasileiro
(1983). Também se incluem na sua produção os contos de Caminho sem Horizonte
(1958), a Antologia de Poetas Bissextos do Ceará (1970) e obras sobre educação.
Detentor dos prêmios “Cassiano Ricardo”, de São Paulo; “Filgueiras Lima, do
Ceará; “Farias Brito”, da Prefeitura Municipal de Fortaleza; “José Albano”, da
Universidade Federal do Ceará, e “José Veríssimo”, da Academia Brasileira de
Letras.
Fonte:1001 Cearenses Notáveis- F. Silva Nobre.
Data
de Nascimento: 25/7/1923