domingo, 12 de abril de 2020

JUÇARA VALVERDE LEVA SEU LEITOR À REFLEXÃO



MONÓLOGO À VIDA
Juçara Valverde
(Da União Brasileira de Escritores-UBE)

     Conversando com a vida, tenho dúvidas de como agir.  Basta respeitar o indivíduo e sua essência, na preservação da Sociedade? Reavivar valores morais preestabelecidos ao longo dos anos, regras e leis? Mas como, se eles são diferentes de uma sociedade para outra, em cada grupo ou gueto? Sabemos do declínio dos valores estabelecidos no passado.
     E os valores sociais?  Conviver de forma harmoniosa faz a diferença e perpassa à família o ambiente de trabalho, os espaços públicos, onde a cordialidade é fundamental, como também o respeito às pessoas e às suas diferenças. Tudo se apoia fortemente no diálogo, que, em sendo saudável, produz resultados positivos e resulta em relações mais amigáveis. O respeito é importante e se destaca, para superar diferenças.       
     A fé é o mais poderoso valor religioso, seguido da compaixão, da caridade e da esperança. Relevâncias que possibilitam um amanhã mais digno. As religiões estabelecem e impõem valores na construção das sociedades. No Cristianismo atualmente há dois grandes segmentos: católicos e evangélicos, que disputam espaço no inconsciente coletivo.
     Outro ponto fundamental é a ética, com seus conjuntos de regras de conduta, que podem mostrar como uma pessoa pode ser leal, transparente e nutrir os mais elevados valores. A ética atua diretamente com a moral das pessoas, mostrando o mais certo a se fazer, como e porque se faz. Talvez devêssemos demonstrar de modo mais eficaz no nosso cotidiano.   
         E os valores materiais numa sociedade capitalista? O Consumismo, a valorização das questões materiais como forma de realização, valores de desejo, necessidade urgente de realizar, consumir e comprar. A sociedade se movimenta o tempo todo e se nutre de escassez de tempo, mal distribuído e incoerente, que cruza com a grande diversidade entre as pessoas, seus sonhos, metas, projetos e realizações. Valores materiais é tudo aquilo que o corpo humano precisa para sobreviver e se satisfazer em seu dia a dia, do alimento aos bens supérfluos. Esses valores materiais adquiriram, ao longo do tempo, grandes mudanças e surgem como uma nova prática em uma sociedade ansiosa e angustiada. Vive-se a intensa insatisfação com os padrões estabelecidos e valores estéticos de aparência, vestimenta e estrutura corporal, nessa nossa aldeia global de grande diversidade. Portanto, tudo isso tem o potencial de provocar baixa autoestima nas pessoas, influenciadas pela mídia, televisão e cinema, que atuam e contribuem, ditando e criando modismos de como as pessoas devem seguir ou agir. Resistir, renovar e se reinventar são linguagens do hoje que demandam rotineiro esforço pessoal e coletivo.  
     Venho refletindo sobre como irá caminhar o nosso Planeta Azul. Será que conseguiremos vencer tanta desigualdade, que só nos iguala na desgraça, nos caixões, lado a lado? Nesse desértico isolamento, tudo ficou para trás ou para o futuro. O que esperar? O que será possível amanhã?  Sem respostas, vivo. Gosto de gente e dúvidas e incertezas me assaltam, sobressaltam e ameaçam. Hoje, converso com a insônia. A luz no fim do túnel está distante, mas amanhã, quem sabe?

sexta-feira, 10 de abril de 2020

INTERESSANTE TEXTO DE GRECIANNY CORDEIRO





CORONAVÍRUS
O NOSSO
RAGNARÖK


          Na mitologia nórdica, o Ragnarök ou a Batalha Final, seria uma luta intensa e terrível travada entre os deuses e os gigantes, que resultaria no fim do mundo, com a morte de vários deuses, dentre eles, Odin, Thor e Loki.
Com o crepúsculo dos deuses, o mundo passaria por catástrofes naturais: um inverno longo e rigoroso, sem primavera, outono ou verão; a terra se estagnaria e não produziria mais um alimento sequer; o Sol e a Lua escureceriam num breu interminável; as estrelas desapareceriam do firmamento; um grande terremoto abalaria a Terra, que submergiria na água; os animais e seres humanos desapareceriam. Seriam tempos difíceis, com a destruição dos nove mundos de Yggdrasil, a árvore sagrada que sustentava o céu e a terra. Ao Ragnarök sobreviverá apenas um casal de humanos, responsável por repovoar a terra, Midgard.
         Em tempos de coronavírus ou covid19, parece o mundo inteiro viver uma espécie de Ragnarök. Um vírus, portanto, invisível e silencioso, vem se alastrando pelos países dos vários continentes, deixando um rastro de destruição por onde passa, infectando milhares e milhares de pessoas e causando a morte de muitas delas; provocando a derrocada de economias e o colapso do sistema de saúde, inclusive, nos países ditos de Primeiro Mundo.
         Quisera fosse a pandemia do coronavírus fruto de nossa imaginação com tendências apocalípticas, ou mesmo, pura e simples mitologia.
         Quisera fosse a pandemia do coronavírus um terrível pesadelo do qual pudéssemos acordar no dia seguinte e ver que o mundo continua tal qual deixamos antes de dormir, as pessoas seguindo para o trabalho, as crianças indo para as escolas, os turistas passeando despreocupados pelos pontos turísticos, o comércio e a indústria funcionando a pleno vapor...
         Mas o coronavírus nos trouxe um imprevisível Ragnarök, capaz de mostrar o quanto somos vulneráveis enquanto seres humanos, o quanto precisamos um do outro, o quanto a atitude de um reflete em todos os outros, o quanto tudo é efêmero.
         Esse Ragnarök epidemiológico será a batalha final da humanidade e a sua luta pela sobrevivência contra um inimigo invisível e possante, a desafiar a ciência, a tecnologia, a economia, o sistema de saúde e, sobretudo, nossa condição de seres humanos que precisam se solidarizar na adversidade e se unir em meio ao caos.
         O crepúsculo dos deuses, quem sabe, se transformará na alvorada de um mundo bem melhor para se viver.
         É preciso crer.

(in:editorialafl.blogspot.com.br)

Grecianny Cordeiro ´membro de várias entidades literárias, entre as quais, Academia Cearense de Letras, Academia Fortalezense de Letras e Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil - AJEB/CE

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Crônica/Poesia (soneto decassilábico português) - VIANNEY MESQUITA





OCIOSIDADE INDUZIDA
Quinze dias hoje, 29.3.2020


 Na ociosidade e na abundância,
desequilibra-se a razão.
(TITO LÍVIO).


Perfaz, hoje, 29.03.2020, exatos quinze dias que, ex-vi de determinação das autoridades sanitárias do Mundo, muitos se afastaram das suas constâncias laborais, culturais, de ócio público – como cinemas, teatros, circos entre outras - para permanecer no recesso das próprias casas, a fim de driblar a temerária covid-19 (não merece letra maiúscula).

  Este acrimonioso e odiento mal pandêmico – insensível, invisível, inodoro, insípido e inaudível – avesso, pois, aos sensos humanos - já mexeu com 600 mil viventes ou mais, mandando-os para as casas de saúde e aos carneiros de cemitérios, obrigando o orbe inteiro a uma reserva forçada e difícil, que muito preocupa e deixa buliçosos e traquinas os seus circunstantes.

Defesos de participar dessas intimidades e frequências sociais em todas as situações, sem o natural deleite social, ínsito aos hominídeos, após essas duas semanas de convívio físico-social interdito, em remissa forçosa em seus lares (e nem são todos os que os possuem!), os habitantes da Terra prosperam na sua vontade firme de se verem livres desse portentoso vírus, de tudo fazendo e ao geral se obrigando com vistas à conquista desse desiderato.

Felizmente, também – sem me reportar aos inomináveis males econômicos que esta circunstância fez pojar à sociedade, mormente às comunidades pobres e miseráveis, o que é de gravidade desemparelhada – a condição de isolamento nos deixa mais cuidadosos e conscientes, ainda, acerca dos nossos procedimentos de cariz humano-procedimental.

De tal maneira, a ocasião agora perpassada nos concede o lance de revistar nosso transato ético, comportamental e deontológico, a cujo raciocínio não era dado azo em virtude do tempo consumido com o labor, a vida urbana, os cuidados com o corpo e, em muitos casos, a transcendência para o sobrenatural, um “pouco” esquecida quando sob o perfeito confortamento vital.

Esta comodidade, fluente no âmbito da normalidade vivífica, parece nos isentar das responsabilidades relacionadas à existência posterior ao exício corporal – a pós-animação terrena - para todos os credos, quer cristãos ou adeptos de motos confessionais outros e - por que não – até os ateus e agnósticos – para alguns dos quais guardo a certeza de que adquiriram bilhete para bons assentos na vida eterna, de tão perfeitos que são seus procederes...

Sem muitos quefazeres, na fruição da remissa forçada, então, comecei a pensar, tendo essas reflexões abicado neste soneto decassilábico português, assentado no texto-prosa expresso na sequência.

Conquanto não seja simpático a férias longas, como esta quarentena, vou, a pouco e pouco, cumprindo meu castigo, merecido, no concerto deste “inferno” de suspiros que solto há quinze dias.

A quarentena, tal como os sais diapiros, conforme exprime a Geologia, que rasgam as rochas e a terra para aparecer em cima e estragar plantações, leva o remisso a fazer tudo o que puder para matar o tempo, no exemplo do quarteto dois, que recorre ao lúdico, como os jogos de gamão e firo, conservando-se no lar para o coronavírus não invadir.

Então, em ambiência tranquila, embora acossada, tendo o lugar de morada como fortaleza, remansa amortecido o tempo vagaroso, para, nessas férias, remuneradas – diga-se - pôr nas mãos da Santíssima Trindade esta lida remanchona que, tenho convicção, logo terá termo.

Veja o caríssimo leitor o emprego da rima encadeada nos quartetos, o que parece conceder um pouco mais de estesia aos versos decassilábicos portugueses.  
OCIOSIDADE INDUZIDA
Não saboreio extensos retiros,
Em cujos giros vou pagando a pena,
Nesta geena de infaustos suspiros,
Sob autogiros, há uma quinzena.

Na quarentena, os sais dos diapiros
Furam os papiros, rochas à centena
Forçando a arena a gamões e firos
E o torpe vírus não adentra a cena.

Nesta tranquilidade induzida,
Em casa, valhacouto de guarida,
Amorteço o Chronos vagaroso.

Assim, em férias (com féria) da vida,
Entrego esta preguiçosa lida
Ao nosso Trio Todo-Poderoso!