segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

SONETO COM O AZUL DA MOÇA DO RETRATO - Carlos Augusto Viana



SONETO COM O AZUL DA MOÇA DO RETRATO
Carlos Augusto Viana
(Da Academia Cearense da Língua Portuguesa).

A moça do retrato é toda azul
e se veste das fibras da paisagem
Em seus olhos, as tâmaras acendem
as nuvens de um crepúsculo em miragem.
A moça azul flutua numa janela
emoldurada pelos grãos do mar.
Seus cabelos abrigam os navios
encalhados no sal da preamar.
O azul dessa moça é assim tão líquido
que se alastra nos cântaros  do vento; 
e, inaugurando rios, já se derrama
nos prados estivais do pensamento.
A moça, sendo azul em seu retrato,

só se semeia o pão do amor exato.

FOTOGRAFIA - Vicente Alencar


FOTOGRAFIA
Vicente Alencar
(Da Academia Cearense da Língua Portuguesa e da ALMECE)

A imagem da amada
brilha na fotografia
da escrivaninha.
Serena,
de perfil envolvente,
com olhar que me passa
bela mensagem.
Sinto a fortaleza
que emana
do seu sorriso,
que amo,

cada dia mais.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

“Conhecimento do rebanho e das ovelhas”: o sacerdote, de acordo com João Paulo II Anotações pessoais do papa polonês são publicadas pelo cardeal Dziwisz


 Fez alarde na mídia, entre ontem e hoje, a notícia de que São João Paulo II manteve uma “relação de grande proximidade“, ao longo de mais de 30 anos, com a filósofa polonesa naturalizada norte-americana Anna-Teresa Tymieniecka.
A correspondência intercambiada entre o papa e a filósofa, segundo a mídia, teria sido “mantida em segredo” pela Biblioteca Nacional da Polônia durante anos.
A história
Eles se conheceram em 1973. Karol Wojtyla era arcebispo de Cracóvia. Anna-Teresa viajou dos Estados Unidos até a Polônia para conversar com o então cardeal sobre um livro de filosofia que ele tinha escrito.
Pouco tempo depois, começou a correspondência entre o cardeal e a filósofa, que decidiram trabalhar em uma versão ampliada do livro. Os dois se encontraram a partir de então muitas vezes e intensificaram a correspondência, que, naturalmente, com o tempo, se tornava menos formal.
Em 1976, o cardeal Wojtyla participou de um encontro católico nos EUA e foi convidado por Anna-Teresa para ficar na casa de campo da família, em Vermont. Grande apaixonado pela natureza, Wojtyla aparece em fotos daquele verão bastante alegre e descontraído junto à família de Anna-Teresa.
Em setembro do mesmo ano, ele escreve para ela:
“Minha querida Teresa, recebi as três cartas. Você escreve que está arrasada, mas não consegui encontrar resposta para essas palavras (…) No ano passado, já estava buscando uma resposta para essas palavras: ‘Eu pertenço a você’. E, finalmente, antes de partir da Polônia, encontrei uma forma: um escapulário. A dimensão na qual aceito e sinto você em todo lugar em todos os tipos de situações, quando você está perto e quando está distante”.
O teor dessas cartas pode dar a entender que Anna-Teresa tinha se apaixonado pelo cardeal. Esta é a opinião, por exemplo, de Marsha Malinowski, a comerciante de manuscritos que negociou a venda das cartas para a Biblioteca Nacional da Polônia. “Acho que isto se reflete completamente na correspondência”, conclui ela, em entrevista à rede BBC.
Anna-Teresa não foi a única mulher com quem o futuro papa João Paulo II manteve correspondência e amizade. Desde a juventude, Karol Wojtyla cultivou uma saudável relação de proximidade com várias amigas, entre elas Wanda Poltawska, psiquiatra com quem trocou cartas ao longo de décadas.
O que causou barulho na mídia no caso de Anna-Teresa foi a “intensidade pessoal” das cartas e o fato de que a filósofa era casada. De fato, após o horror nazista e a Segunda Guerra Mundial, ela tinha se mudado para estudar nos Estados Unidos, onde se casou e teve três filhos.
Uma amizade intensa e familiar
O marido de Anna-Teresa, Hendrik Houthakker, também era amigo de João Paulo II. Hendrik era um renomado economista de Harvard e, após a queda do comunismo, aconselhou o papa sobre a economia dos países do Leste Europeu. O papa o homenageou pelos serviços prestados.
Quando João Paulo II foi diagnosticado com o mal de Parkinson, Anna-Teresa passou a visitá-lo com frequência, além de lhe mandar flores e fotos da casa de campo de Vermont, que tanto encantara o cardeal Wojtyla no verão de 1976.
Depois da última visita do papa à Polônia, ele escreveu para Anna-Teresa sobre sua pátria: “Nosso lar comum; tantos lugares onde nos encontramos, onde tivemos conversas tão importantes para nós, onde vivenciamos a beleza da presença de Deus“.
A mídia, os internautas e suas previsíveis interpretações
Uma amizade cultivada tanto em família quanto em particular, na qual se vivencia e destaca “a beleza da presença de Deus”… Hmmm, não parece uma realidade palpável para boa parte da imprensa laica e dos seus leitores.
O barulho da mídia (e dos internautas que distribuem suas doses de infantilidade em forma de comentários) foi impulsionado, para variar, pelos “furores venéreos” típicos da nossa “cultura” sexualmente frustrada e doente: o que pipocou em torno à revelação da correspondência entre São João Paulo II e Anna-Teresa Tymieniecka não foi a beleza da amizade, a vivência pessoal e intensa da espiritualidade, um diálogo aberto sobre sentimentos e sua sublimação, a transparência afetiva, os conteúdos filosóficos debatidos, a natureza, a família, a pátria, Deus. Não, nada disso. O que pipocou, previsível e mediocremente, foram as pobres e vulgares insinuações de algum possível escândalo sexual.
É verdade que boa parte dos artigos fez a ressalva de que “não há sugestão alguma de quebra do celibato por parte do papa“, mas também há insinuantes martelamentos em aspectos como “a mulher era casada“. E se fosse solteira? Não haveria, será, o mesmíssimo insinuante martelamento no fato de que “a mulher era solteira“? E se fosse viúva? Zzzzz.
Nossa sociedade tem dificuldades graves para construir e nutrir amizades sólidas. Amizades profundas são uma raridade. Entre homem e mulher, então, quase uma aberração. Entre homem e mulher e sem sexo? Hahaha. Amizades capazes de transparência afetiva e abertura filosófica e espiritual soam quase tão alienígenas quanto a beleza da castidade e do celibato por parte de um homem forte, jovem e saudável. E amizades em que há intercâmbio de correspondência, para pessoas que mal sabem produzir uma linha sem erros de ortografia, parecem ser, irremediavelmente, incompreensíveis.

Pobre mundo. Ora pro nobis, São João Paulo II.


sábado, 6 de fevereiro de 2016

NOBEL DE LITERATURA: LYGIA FAGUNDES TELLES É INDICADA

O Nobel distante do Brasil 


 Lygia Fagundes Telles foi a escritora indicada este ano pela União Brasileira de Escritores para o Prêmio
A escritora  Lygia Fagundes Telles tem obras traduzidas para oito idiomas, como polonês e tcheco

 
A indicação da escritora Lygia Fagundes Telles, de 92 anos, provocou burburinho nas redes sociais e acendeu, mais uma vez, a esperança de um autor brasileiro conquistar o Prêmio Nobel de Literatura. O nome da ficcionista foi o escolhido pela União Brasileira de Escritores - instituição, regularmente, convidada pela Real Academia Sueca para sugerir concorrentes.
De certa maneira, a ânsia de um dos nossos escritores ser agraciado com o Nobel lembra a eterna torcida para levarmos um Oscar, na categoria de Filme Estrangeiro (as demais, nos parecem demasiado distantes, senão inacessíveis). Acontece que, se há filmes nacionais que justificam a empolgação dos cinéfilos, o mundo literário costuma vacilar diante da escolha de seu concorrente aquele que é o mais famoso prêmio literário do mundo.

Não falta quem torne pública a sua indignação diante de uma "injustiça história". São aqueles que evocam nomes que mereciam ter recebido, caso dos gigantes Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto, Jorge Amado, Guimarães Rosa e Graciliano Ramos. Insistir nesse ponto, do que deveria ter acontecido, é esquecer que outros grandes nomes da literatura também ficaram de fora da lista da honraria. O francês Marcel Proust não levou, talvez por tocar em pontos polêmicos à época, com seu "Em busca do tempo perdido". O irlandês James Joyce sequer foi indicado. E, ainda hoje, os argentinos se ressentem por Jorge Luis Borges não ter levado o prêmio.

O problema dos escritores brasileiros contemporâneos não é a falta de talentos literários. Difícil mesmo é chegar a um consenso quanto ao candidato brasileiro. Os EUA têm uma lista de favoritos, com Philip Roth à frente; os japoneses, Haruki Murakami. Aqui, alguns nomes são recorrentes, como o poeta e crítico de arte Ferreira Gullar e a romancista Nélida Piñon, já indicados pela UBE. A entidade, contudo, já fez indicações difíceis de entender. Em 2014 e 2015, o nome encampado pela UBE foi o do baiano Moniz Bandeira - diplomata, historiador e cientista político, com incursões pela poesia, e pouca expressão no meio literário brasileiro. A opção por Lygia Fagundes Telles aponta em outra direção

Reconhecimento

A escolha de Lygia, autora de Ciranda de Pedra e As Meninas, entre tantos outros sucessos de crítica e de público, foi unânime. "Lygia é a maior escritora brasileira viva e a qualidade de sua produção literária é inquestionável", disse o advogado e escritor Durval de Noronha Goyos, presidente da UBE, em comunicado.

No fim do ano, ela venceu o Prêmio Fundação Conrado Wessel 2015 na categoria Cultura, e ganhou R$ 300 mil. A cerimônia de entrega deve ocorrer ainda neste semestre. Em novembro, ela foi homenageada durante o Encontro Mundial de Invenção Literária, em sessão da Academia Paulista de Letras (ela é imortal, também, da Academia Brasileira de Letras), e causou comoção ao dizer que sua luta foi "heroica e desesperada". Lygia Fagundes Telles fez história ao se tornar uma das primeiras mulheres a estudar Direito no Largo São Francisco.

A autora tem obras traduzidas para o alemão, espanhol, francês, inglês, italiano, polonês, sueco e tcheco. Alguns de seus títulos foram adaptados para o cinema, teatro e televisão. A presença de Lygia no mercado estrangeiro é um ponto positivo para sua candidatura. 

Ainda que o Nobel não recorra exclusivamente a este critério (vide a premiação do francês Patrick Modiano, em 2014, que à época só tinha um único título disponível em inglês e, no Brasil, estava com seus poucos livros traduzidos fora de catálogo), analistas apontam a diminuta expressão do português no mundo editorial e literário, em escala mundial, como um dos obstáculos enfrentados pelos escritores brasileiros. 

Desde a primeira edição do prêmio, em 1901, apenas um autor de língua portuguesa recebeu o Nobel de Literatura, o português José Saramago, em 1998.

Os mais recentes premiados com o Nobel de Literatura foram a bielorrussa Svetlana Alexievich (2015), o francês Patrick Modiano (2014), a canadense Alice Munro (2013), o chinês Mo Yan (2012), o sueco Tomas Tranströmer (2011) e o peruano Mario Vargas Llosa (2010).

(Com informações da Agência Estado)

FONTE: DIÁRIO DO NORDESTE
http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/o-nobel-distante-do-brasil-1.1486634 http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/o-nobel-distante-do-brasil-1.1486634

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

TRÊS POEMAS DE SÉRGIO MACEDO



ILUSÃO

Os mares invadem os litorais de tua vida
Talvez valha invadir os mares
Adentrar até os horizontes
Derramado sobre as serras
Delas extrair todos os desertos possíveis
Criar a solidão que transcende quaisquer isolamentos
Debruçar-se sobre as chuvas insofismáveis
E criar os mares a partir dessas ilusões.




CANDEIA

 Mesmo após se por,
Horizonte turbulento e lúgubre,
Permaneceu pairando entre nós,
Anjo branco.

Mesmo em luzes apagadas
Encontrou e mostrou caminhos,
Desvendou segredos,
Abusou de ser presente
Na ausência.

Legendário mestre e criador
De magnas virtudes
Jamais aceitou as ladeiras do tempo:
Enfrentou-o de igual para igual,
Olhou-lhe os olhos e o fez
Olhar o chão.
Nunca morreu, morrendo,
Pois, só parte de vez o que não cria,
Quem não deixa legado. 
Só vai completo
O que nada inova nem estimula.
Morrer, portanto, uma mentira,
Uma invenção
Para selar o tempo
Dos que não deixam saudades.




 ALMA/ tempo em atraso

Ela não disse nada,
silêncio de sepulcros,
alma aprisionada ao universo.
Eu só queria que voltasse um pouco,
sentada em um cadeira de balanços,
nesse vento gostoso da manhã, conversasse comigo.
não suportou e foi-se
deixando-me órfão de emoções.
Sua cadeira  de balanço, nunca usada, vazia, tem nome de tédio.
O vento de todo o dia,

Vazio, balança a cadeira,
Como se me alentasse
Em sua ausência.
Em seu lugar, também
Seria refém do universo,
Tirana prisão,
Largaria de mão quem não percebe
A luta ou não a quer,
Deixaria de lado o centurião fugidio,
Mataria todos os deuses do depois,
Do depois sem solução,

Do depois inevitável dos soluços.