quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Homenagem a Ariano Suassuna

Entrevistas de arquivo e programas especiais são resgatados no portal da Rádio Cultura Brasil e celebram o escritor

Cirley Ribeiro e Felipe Tringoni
Paraibano de língua afiada e alma solidária, tesouro nacional, ícone da cultura brasileira. Entre as tantas definições, talvez a que mais tenha agradado Ariano Suassuna em vida foi ter sido chamado de "guerrilheiro cultural". O slogan, atribuído pelo jornalista José Rezende Júnior, referia-se ao trabalho do escritor ao assumir a Secretaria de Cultura do Estado de Pernambuco, em 1994. À frente da pasta, Suassuna levava a cultura brasileira para o centro do palco, nas famosas aulas-espetáculo, em que improvisava e explorava os recursos da commedia dell'arte. Gostava de provocar a reflexão entre os jovens universitários, a plateia preferida durante todo o período em que lecionou, dos 17 aos 65 anos.

Escritor, dramaturgo, professor e político, Ariano Suassuna se encontrava na arte: na literatura, no teatro nas artes plásticas e na música. Em 1970, fundou o Movimento Armorial, que pretendia construir uma arte erudita autenticamente brasileira, colocando em primeiro plano o universo lúdico e cultural do sertão nordestino. Na definição do próprio Suassuna, a "Arte Armorial Brasileira é aquela que tem como traço comum principal a ligação com o espírito mágico da literatura de cordel, a música de viola, rabeca ou pífano e as ilustrações da xilogravura". Com o Quinteto Armorial, liderado pelo compositor Antônio José Madureira, fez shows, gravou discos e levou a proposta para o exterior. Em 1996, ele retomou o projeto, rebatizado de Romançal, incorporou instrumentos tradicionais, como violão, violino, flauta e violoncelo.

Sempre valorizando a cultura nordestina, Ariano transformou o "matuto" do interior em estrela de cinema, com o sucesso da adaptação do Auto da Compadecida, com direção de Guel Arraes. Para o autor, toda grande arte é local. Nasce em determinada região e se universaliza pela boa qualidade e pela divulgação. Costumava citar frase de Tolstói para ilustrar o pensamento: "pinte bem a sua aldeia, que você será universal, mas pinte bem", em referência à qualidade necessária a todo trabalho artístico.

Membro da Academia Brasileira de Letras desde 1989, assumiu a cadeira de número 32 sucedendo Genolino Amado. Ele também se tornou membro da Academia Paraibana de Letras em 9 de outubro de 2000. No mesmo ano, ainda se tornou doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Foi tema de enredo no carnaval carioca, na escola de samba Império Serrano, no Rio de Janeiro, e na Mancha Verde, no carnaval paulista.

Em 2006 ganhou o título de doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Ceará, mas que veio a ser entregue apenas em 10 de junho de 2010, às vésperas de completar 83 anos. Recentemente, Ariano passou por algumas capitais do País com suas aulas espetáculo e o projeto multimídia Ariano Suassuna - Arte Como Missão, realizado em homenagem ao escritor.

Dos arquivos da Cultura Brasil, você pode ouvir três ricas entrevistas de Suassuna concedidas ao programa Estúdio 1200.

Na primeira delas, ele recebe a reportagem da Rádio Cultura em sua casa no Recife. Retraído, Ariano não gostava de dar entrevistas. Como diz Inimá Simões, era "um aristocrata sertanejo". Um tanto desconfortável no início da conversa, o escritor foi se soltando e revelando seu claro raciocínio sobre questões culturais, o ofício da escrita e a mídia.

Dois anos mais tarde, na cidade de São Paulo, o então Secretário de Cultura de Pernambuco lançava seu projeto Pernambuco - Brasil com uma aula-espetáculo. "Sujeito afirmativo", como ele mesmo dizia, Suassuna expõe suas opiniões sobre políticas de cultura e manifestações artísticas brasileiras e estrangeiras sem meias palavras.

Por fim, em 1996, vinte anos depois de lançar o Movimento Armorial, Ariano Suassuna encampou o Romançal, experiência de orquestra erudita a partir do universo popular do nordeste brasileiro. Em depoimento à repórter Cirley Ribeiro também na capital paulista, o escritor detalha a proposta, fala da universalização da arte e explica porque gostava de ser identificado como "guerrilheiro cultural".Confira aqui.
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terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

ROSAS DA MANHÃ - GISELDA MEDEIROS




    Quando vieres
     vem de leve
     assim como a primeira estrela
     que paciente desponta
      jogando sua luz
      por entre as brumas
      consciente da importância
      de sua chegada.

      Vem com dedos de carícias
      silenciosas
      com mãos de artista
      leves
       para que não me doa
      o poema que fizeres.
                            Ou melhor
                            vem como quiseres.
                            Estarei aqui
                            em mim
                            dentre outras mulheres,
                            mas a única que te sabe
                            florir em versos.
                           
                            Mas vem como a primavera,
                            sem pressa para voltar,
                            consciente da beleza das cores
                            que em mim deixarás
                            em aveludados olores.

                            Vem como a tarde
                            que espera a noite para adormecer.
                            Quero ver-nos florir
                            em rosas de alvorada
                            quando despertarmos manhã.

                         (do livro "Tempo das Esperas)

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

QUARTA-FEIRA DE CINZAS - REFLEXÃO POR VIANNEY MESQUITA

REFLEXÃO NO
INÍCIO DO
TEMPO QUARESMAL

MEMENTO, HOMO...

Vianney Mesquita*

Estou perto do dia da minha derradeira viagem, um grande salto da terra (THOMAS HOBBES.YWestport, 05.04.1588 –Derbyshire, 04.12.1679).

Quarta-feira de cinzas é dia de igreja católica lotada, muitas vezes até por pessoas que a frequentam somente nesta data, quer em virtude de superstição, arrependimento pelos seus excessos e transportes durante o carnaval, ou mesmo as duas razões combinadas. Infelizmente, entretanto, tem ressalto o primeiro pretexto manifesto na crendice, retratado na supersticiosidade e no senso de fanatismo religioso.

Propício, todavia, radica o fato de todos evocarem a leitura na Bíblia em Língua Portuguesa, onde está expressa em Gênesis, 3:19, a divisaLembra-te, homem, que és pó e em poeira te tornarás, quando o Criador, perpetrada a falta original,expulsou Adão do Paraíso, prescrevendo-lhe intensos trabalhos, rematados com a morte, ocasião em que o corpo  a carne – de nada mais aproveitará.

De modo diverso do ocorrente na Banda oriental, a cultura do Ocidente nos infundiu a ideia de que o fim pela morte é algo terrível, embaraçoso, porquanto está disposta nos limites do impossível a admissão da nossa finitude, do exício definitivo da vida, de modo a persistirmos no raciocínio irreal e ilusório de que não se efetivará o trespasse da alma para a Outra Dimensão, pois a existência terrena seria sem termo.

Eis, todavia, que balança esta “convicção”, absolutamente equivocada, ao menos uma vez por ano e no primeiro dia da Quaresma, coincidente com a Quarta-Feira de Cinzas. É quando, pois, o padre da Igreja de Roma – cruzando na testa de cada um as cinzas remanescentes das palhas do Domingo de Ramos imediatamente anterior  representa Deus a nos alertar para o fato de que a Humanidade é pó e à poeira retornará em definitivo como matéria.

Então, ao modo como a Igreja procedia antes do Concílio Vaticano II, é substituída a frase latina Memento, homo, quia pulvis, es et in pulverem reverteris, igual a “Lembra-te, homem, que és pó em pó te tornarás”, podendo o sacerdote dizer, alternativamente: “Arrependei-vos e crede no Evangelho”.

Esta verdade é terminante e vale para a Humanidade inteira, seja na velhice, na senescência, esteja o cidadão na circunstância de “preferencial” – como é da moda  vigor, na saúde e bem-estar socioeconômico, na doença e indigência, em particular, na juventude ou nova adultidade, em qualquer estado, se impõe que todos se deem conta de que o reino do céu está perto, sendo crucial que preparemos o caminho do Senhor, endireitando nossas veredas, à maneira como expresso por João Batista, a voz que clamou no deserto.

Então, no dia inaugural da Quaresma, examinemos a consciência e tomemos tento em remover os habituais excessos, apagar as rixas com os circunstantes, viver mais a Palavra, ao procurar a indicação divina, a fim de que delineie a correção dos rumos de cada um, sem simuladas carolices nem devoções aparentes, vedadas as manifestações atitudinais, limitadas ao âmbito do edifício da igreja, porém com eficácia em todo lugar e a qualquer tempo.

De tal maneira, experimentamos a oportunidade de atualizar nossa Contabilidade para demonstrá-la em balanço perfeito aos  “órgãos de controle” do Alto, com vistas a deixar nossos registros sempre limpos e nossa ficha sem rasuras nem lacunas que possam se fazer óbices impedientes da nossa intenção salvífica.
Então, completando a reticência do título, está em Gênesis, 3:19, a importantíssima divisa latinaMemento, homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris, convidando-nos a evocar a noção de que, na qualidade de corpo, somos cinzas, aquelas cruzadas hoje nas cabeças de cada qual. 


*Vianney Mesquita 
 Docente da UFC 
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa  
Acadêmico Emérito-titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo 
Escritor e Jornalista 


(in:  academiacearensede jornalismo.blogspot.com.br