sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

ARTUR EDUARDO BENEVIDES, EM "POEMA DE CONFISSÃO"


Sou teu soldado-clarim.
... Tens o segredo milenar da fonte.
E sei que estás, imensamente, em mim
como a linha do azul em cima do horizonte.
Teu jogral e andarilho,
vejo a tarde a descer de teu cabelo
tocando a solidão do tombadilho
à luz do Sete-Estrelo.
De repente, qual se a força do vinho me tomasse,
percebi-te na árvore em que nasce
a tâmara da vida.
E encontro em teu olhar minha nave perdida.
Nesse olhar de albores e flamboyants,
guardando os resedás e os rios das manhãs!
Quanto o esperei, desde longínquas datas,
mas as cousas me foram bem ingratas
passando por mim quais fantasmas num espelho.
Então, como num Canto de endormir criança,
chegaste com leveza de esperança
e ficaste em mim
- ó vilancete de luz ouvido num jardim,
- ó chuvas de infância cantando sobre as telhas,
despertando o balir alegre das ovelhas!

Ai, com tua escada de estrelas me salvaste
de frios iatagãs
Com teu jeito de lã no inverno me amaste.
E vi a teus pés rosas e avelãs.
E eu, com velhas mágoas como domicílio,
ficando junto a ti, não morrerei no exílio.
(do livro POEMAS DE MESA - 2012)

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

MORRER DE AMOR - Giselda Medeiros


Deixa, amor, que eu repouse nos teus braços,
E durma um instante apenas neste abraço.
Deixa que eu me sinta um pouco criança,
Para sonhar meus sonhos de esperança.

Deixa, amor, aquecer-me ao teu regaço,
Tirar o enfado do meu corpo lasso.
Deixa, num instante só, as minhas ânsias
Dormirem soltas, sem desesperanças.

Deixa, amor, pois, no corpo, eu sinto o frio
Da solidão agasalhar minha alma,
E tremo e choro e, em vão, me suplicio.

E quanto mais eu tremo, maior a calma
Que encontrarei em ti, no teu regaço!
Deixa, amor, que eu morra, enfim, no teu abraço!

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A CIGANA - SÉRGIO MACEDO






Cigana sem canto
Sereia de muitos leitos, (bancos de areia)
Espuma de muitos mares
Transita serena,
Transforma
Serena sereia
De verdes ( vermelhos) e profundos oceanos,
Na face.
Transporta labirintos que seriam
Simplesmente caminhos.
Caminhos exigem tráfego,
Pensas, ( e) logo, trans-itas,
Trans-gole
Trans-nós,
Num senão transformado
Ou recém destruído em seu cerne.

Um cesto com pedaços do universo
Foi-me dado.
Eu, deus de meus limites,
Respeitado o Deus do ilimitado,
Passo pelas pontes,
Escritas pela velocidade da passagem.
Não lerei escritas antigas.

Há rostos obtusos
Ou obscenos
Nessa guerra, há pausas e moças
Há tempo correndo atrás do passado e moças
Há moças de carne e osso e alma e espírito.
Que choram e sorriem e clamam e desesperam
E morrem.
A guerra do dia só soma, só soma.

MOTIVOS - III (para Dr. Martinho Rodrigues)



MOTIVOS - III
Giselda Medeiros


                            A vida é um barco de espantos... e sei
                            que nos damos a ele, muitas vezes, lépidos, fagueiros,
                            rios que somos de nós mesmos.
                            Gemendo tempestades, ensaiamos nossas memórias
                            imortalizando-nos no limo de nossas várzeas
                            ou a esperar o cio do luar.

                            Mas...
                            (como o mas é inevitável!)
                            ardemos em ventos de paixão e, eufóricos,
                            cantamos etéreas canções azuis
                            no cais de nossas ilhas emersas
                            do infinito mar por onde escorre o barco,
                            que nos levará ao porto da solidão.