segunda-feira, 12 de outubro de 2015

POÉTICA - VIANNEY MESQUITA



SONETO-OXIMORO

Vianney Mesquita*
        
Sendo mentirosos profissionais, devem os poetas ter excelente memória (Jonathan Swift - *Dublin, 30.11.1667 +19.10.1745).

Gratíssima recordação tangeu-me a alma à segunda metade dos anos 1960, quando estudava na então Escola Técnica Federal do Ceará, hoje Instituto Federal (Campus de Fortaleza – Av. 13 de Maio, 2081 – Benfica). Neste tempo, na E.T.F.C. havia excelentes professores de Língua Portuguesa – conforme, certamente, ainda há - como o foi meu guru Hélio de Sousa Melo, fundador da Academia Cearense da Língua Portuguesa, seu primeiro presidente.
Tal sucesso, apontado ao abrir estas notas, decorreu de leitura do magistral texto, cujo autor é o Dr. Humberto Ellery, publicado no blog da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, no dia 11.10.2015, sob o título Golpe Democrático, em que se reporta, em estilo e correção irreprocháveis, à deplorada imagem do oximoro (mó), perpetrado pela Excelentíssima Senhora Presidente da República, convenientemente comentado pelo Autor, não me concertando fazer adendos nem reparos.
Com efeito, passei o dia de hoje todo (11.10.2015) procurando o manuscrito de um decassilábico português de minha lavra, pois, naquele tempo, ainda tinha bom curso a craveira do soneto entre os poetas, e havia um grupo de alunos que, sob a orientação do Dr. Hélio Melo, primava pela composição artística nesse gradil. O texto que procurei, como quem demanda um excelente deputado, não foi encontrado e o jeito que tive foi preencher os claros da memória para complementar as pouquíssimas passagens das quais não guardei decorado e de salto o conteúdo completo. Esse expediente métrico foi produzido a instâncias do dito decassílabo camoniano, acerca do qual se reportou o Articulista (“Amor é fogo que arde sem se ver”...), exatamente na exploração do símile oximóron.
Não me contive e reproduzo a composição de dez ictos, disparatada, de estudo, exatamente para configurar o oximoro.

SONETO-OXIMORO

Na expungida visão de quem jaz vivo,
Cego visório o meu exício ensaio,
Sombrio e alegre, derrotado e gaio,
Prossigo morto e retrocedo ativo.

A igual tempo me alevanto e caio,
Em inextrincável vividez de extinto,
Então, me apresto da verdade e minto,
Olhando, bem de frente, de soslaio.

Cadáver esperto, cego feito lince,
Conquanto ao mesmo instante assente e pince,
É minha insânia lúcida que exorta:


Deixa-me, então, que eu rime em verso branco,
Em semelhante destro e esquerdo flanco,
Doutas bobagens que o papel suporta!