sexta-feira, 19 de maio de 2017

VIANNEY MESQUITA


   SONETO VAI, SONETILHO VEM
  
                                                           Vianney Mesquita*

             Sentimental é o homem que vê um valor absurdo em tudo e não sabe o preço exato de nada. (OSCAR Fingal O’Flahertie Wills  WILDE. Dublin, 16.10.1854; Paris, 30.11.1900).


  
             Obtive de Cima a mercê de haver conhecido e privado, por muitos anos, da  companhia e benquerença do magistrado, homem de letras e linguista Dr. Sinésio Lustosa Cabral Sobrinho, natural de Várzea Alegre-CE (22.05.1915), autor de qualidade incontendível, cujas obras fazem eco em todo o País, pois docente de língua portuguesa de alçados recursos, poeta inventivo e, em especial,  pessoa de fina educação e esmerada urbanidade.

            O Dr. Sinésio Cabral exerceu a Presidência da Academia Cearense da Língua Portuguesa de 03.03 1984 a 03.03. 1986, tendo ocupado a Cátedra número 03, patroneada pelo filólogo e etnógrafo carioca Antenor Nascentes. Ele editou por quase quarenta anos o Mensageiro da Poesia, ao lume com absoluta regularidade, até seu trânsito para a Dimensão Etérea, em 10 de maio de 2012, às portas dos 97 anos.

            Mencionado periódico –  cujo teor privilegiava poemas e comentários analíticos – chegava aos consulentes sem nenhum custo, pois as despesas de produção gráfica e editorial, bem assim os dispêndios de postagem, corriam a expensas dele, numa louvável peleja para que não afracasse a prática do metro no nosso meio.

            Enviei-lhe, certa vez, algumas colaborações, a primeira das quais foi publicada no número 209, relativo a abril de 2004, registada na coluna Recebemos e Agradecemos. Aqui a reproduzo – o soneto que foi, como também o faço  com o sonetilho de resposta – ambos publicados no meu Arquiteto a Posteriori – Apreciações Críticas (Fortaleza: Imprensa Universitária da UFC, 2013).



                                    BILHETE


                        Sinésio amigo, muito boa tarde,
                        Neste nubloso mês de fevereiro.
                        A Graça Inata eternamente o guarde
                        E a todo o contingente seu herdeiro.

                        Assinta, por favor, ficar ciente:
                        Grande afeição eu por você sustento,
                        Porquanto este mundo é carecente
                        De benquerer e paz – da vida o alento.

                        Precisamos, também, neste comenos,
                        Agricultemos traços bem amenos
                        Para não amargarmos a desdita.

                        De sua atenção na expectativa,
                        Aguardo uma resposta positiva
                        Com os amplexos do Vianney Mesquita.


            A resposta ao Bilhete excele em qualidade poética e graça na técnica da versificação. Diverso de mim, ao aplicar o decassilábico do pé português, ele se firmou no sonetilho, composição não obrigada ao rigorismo canônico no tocante às rimas das quadras e trísticos.

            Feito, então, excelso poeta, obediente às medidas, aprestou a consonância métrica das estâncias, aplicando o verso redondilho maior – ou de arte menor – isto é, com sete acentos (ictos), semelhante ao da escrita de cordel nordestina, fazendo consoar nas quadras o primo verso da primeira estrofe com o quarto desta e o secundário e quaternário da segunda.

            Consociou, entrementes, o segundo verso da primeira estância com o quarto desta e o secundário e o quarto versos da segunda.

            Já nos tercetos, rimou o primeiro do trístico número um com o terceiro deste e o segundo do último; e o segundo pé do primeiro com o primo e o terceiro do outro conjunto de três versos. Com efeito, nas quadras, aplicou ABAB-ABAB, ao passo que nos trísticos utilizou-se da craveira compositiva ABABAB.

            Como desfecho destas notas, onde descansa a saudade da enorme pessoa que foi Sinésio Lustosa Cabral Sobrinho, comprovemos seu estro e apreciemos o quinau a este escrevente, em castigo pelo mau soneto Bilhete.




                                    S O N E T I L H O


                        Meu caro Vianney Mesquita,
                        Em seu bilhete ouço a voz
                        De quem não quer que a desdita
                        Projete sombra entre nós.

                        E sobre a afeição descrita,
                        Ao dizê-la tanto a sós,
                        No papel me trouxe escrita
                        Bem oito dias após.

                        Dando conta do recado,
                        Em sonetilho, afinal,
                        Relembro: bem-humorado,

                        Sim, no apê residencial,
                        Com meu abraço apertado
                        Do irmão. Sinésio Cabral.


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