quarta-feira, 10 de março de 2010

CHAMAS - Giselda Medeiros



Derrama-se em brasas o sol morrente...
Há gritos de silêncio sobre a terra,
e a alma dos rios, silente, chora a vida
que morre entre as pedras submersas.

Pesado é o céu... E as aves agoureiras
descem as asas sobre a torre da matriz,
o rude bico, as penas eriçadas,
o canto mudo sofrendo na garganta.

No manto aflito do horizonte surgem
assustadas estrelas solitárias,
de brilho morno e, com olhos de surpresa,
espreitam tímidas a timidez da luz.

A noite segue em sua nave de mistério,
a negra mão a controlar as sombras,
a cabeleira densa sobre os montes
e o olhar a derramar-se nos caminhos


(Cantos Circunstanciais)

CANÇÃO DA ESPERA - Giselda Medeiros



Passas.
Teu vulto é um oásis
onde quero aprender
o ofício das areias
nas longas noites
em que as estrelas
fiam fios finos
de fluida luz.

Teus passos na tarde
ecoam ainda
em minhas manhãs,
alvacentas e lânguidas,
como o marulho das vagas
que ficaram para trás.

Mas passas,
indiferente e lento,
sobre meus anseios
com mãos enfeitadas de adeuses
a romper em flores
de esquecimento.

E passas tão perto de mim
e tão distante!
Não conheces o mapa
de meus arquipélagos
nem sabes da beleza
de meus profundos mares
onde há conchas e corais
em êxtase.

Talvez um dia
- um dia desses -
quando pisares as névoas
do meu tempo
e sentires pesar o teu tempo,
talvez, tu resolvas ficar
no tempo dos meus domínios...




(Tempo das Esperas)