segunda-feira, 25 de janeiro de 2010


A ti, ó Poesia,
seios do eterno a jorrar leite e mel,
ergo minha taça
vazia...
Quero vê-la transbordante
de canções
de leite e mel.
Giselda Medeiros

TÃO JUNTOS


Quando aportares em mim
haverá cristais e luz
no peito das auroras.
E minha voz
subirá tão longa e branca
pela noite morna
e tocará as franjas de tua alma.
Hei de reter as rosas
que trarás em tuas mãos
de madrugada.
E, pálida,
minha pele te acolherá
sob o lume faminto
da última estrela.
Aí, estaremos juntos,
um no outro,
como o verde na floresta,
como o vermelho no sangue...
Tão juntos!
Giselda Medeiros
(Tempo das Esperas)

CANÇÃO AZUL


Deixem, por favor,
que eu ponha o azul
nas asas do meu sonho.
Por favor, quero o azul
do azul-de-mar de uns olhos que eu beijei.


Quero esse azul, desnudo, orvalhado.
Com esse azul
farei uma canção tão bela
que até Orfeu a tomará
e seguirá pelos campos de Prosérpina
tangendo-a em sua lira
para encantar Eurídice.

Giselda Medeiros

(Cantos Circunstanciais)

RITUAL

Deixarei que a penumbra destes vales
beba a luz mortiça de tua candeia...
Aí, sim,
haverá explosões de bombas. E clarins
pelos escombros solfejarão sonatas.
E haverá fragrâncias de gerânios
a flutuar nas sombras rosa-pálidas
da concha umedecida de prazeres.

Giselda Medeiros

SE TU ME QUERES


Se tu me queres, dize-me isso agora,
quando ainda em mim a primavera mora,
quando o meu riso, cheio de energia,
espalha ainda chamas de poesia.
Se tu me queres, diminui a hora
desse momento que tanto demora.
Vem semear canteiros de alegria
neste terreno afeito à nostalgia.
Se tu me queres, faze um gesto apenas.
Palavras... não importam realmente...
Quero sentir somente que me queres.
Pois, se eu tiver as tuas mãos morenas,
serei a mais ingênua adolescente
e a mais sensual de todas as mulheres.
Giselda Medeiros
(Cantos Circunstanciais)

SONATA AO LUAR


Meus olhos são como os crepúsculos
que acompanham o vazio das tardes
e choram a solidão das urzes
indiferentes à escuridão das noites.
Meus olhos guardam as súplicas de Orfeu,
o desespero de Tântalo,
a dor de Prometeu.
Meus olhos são como os crepúsculos..
Retêm o silêncio das torres da matriz
e a voz queixosa dos sinos... são o alaúde
que restou sem cordas sobre as ancas do Tempo.
Mas, quando vieres,
assim como um milagre,
aprenderão a solfejar, com o vento,
as mais lindas sonatas ao luar.
Giselda Medeiros

domingo, 24 de janeiro de 2010


SONHAR É MEU OFÍCIO
Giselda Medeiros



Estou atada à âncora do sonho.
Sonhar é meu ofício,
mesmo sobre abismos.
Eu sonharei
entre as frias espadas do sofrimento
e o voo do pássaro do amor.


Sonhar é meu ofício.
Mesmo no silêncio das tocaias,
na estreiteza das veredas,
entre o uivar dos cães da ignorância
e o leve palpitar da rosa entreaberta,
eu sonharei.


Sonhar é meu ofício.
Mesmo que as lâmpadas da fé se apaguem
e gritos firam minha alma
na dança macabra da dor com suas mãos de antílope,
eu sonharei um sonho tão grande e belo
como o mar sob o farol das estrelas.


Sonhar é meu ofício.
Sempre. E depois,
quando etérea substância me envolver,
eu sonharei, ainda assim,
nos versos que compus.


E quando os leres, cheios de mim,
eu estarei sonhando
na voz silenciosa dos poemas
que estarão cheios de ti.

(Tempo das Esperas)

CANÇÃO PARA BUSCAR-TE
Giselda Medeiros
Deixarei que o vento perpasse
o meu ser e dele retire
teu nome, teu gesto, teu vulto
para que eu possa respirar.
Deixarei que as estrelas roubem
teu brilho e em seu olhar azul
prenda-o, assim verei luzir
uma outra vez o meu olhar.
E deixarei que o mar te alcance
com sua voz potente e rouca
para que eu possa ouvir em mim
a minha voz, já quase morta.
E deixarei que o tempo leve
a solidão que o teu silêncio
bordou nas fímbrias do meu ser,
naquela tarde que chovia.
E depois de tudo... ah! depois...
quero ver minha alma cansada
ainda assim te procurar,
sofregamente, e nada, nada
nada de ti reencontrar.
Talvez quem sabe não te achando,
desesperada, e louca, e tonta,
se volte para si, sonâmbula,
para encontrar-se, enfim, a sós.
Mas, como poderei achar-me
se não estiveres em mim?
pois é no teu caminho vago
que traço o meu destino andante
de estrela, de rio, de vento,
margeando sempre a solidão...
(Cantos Circunstanciais)
CONSAGRAÇÃO
Giselda Medeiros

Quando chegares

cansado das noites de vigília,

vem bater-me à porta.

Nesta soleira empoeirada,

encontrarás em pálido espanto

um coração tresloucado

sazonando de indormidas ilusões.

Um coração que não se mostra,

acorrentado qual Prometeu.

Vem. liberta-o da horrível solidão

(abutre que lhe carcome o sonho)

pois livre

há de tecer a liraAdicionar vídeo

e reacender a pira

para a consagração, enfim, do amor.

(Cantos Circunstanciais)


sexta-feira, 22 de janeiro de 2010



A LINGUAGEM DAS MÃOS




Não basta apenas celebrar o amor


em sua magnitude etérea e abstrata.


É preciso também celebrar o encontro.


O encontro que faz o amor concreto e azul.


O encontro - junção do ter e do vir-a-ser,


na efusiva transmutação dos apelos.




Por isso, amado, celebremos juntos,


na comunhão dos nossos gestos e ânsias,


a doçura silenciosa, o grito morno


do encontro de nossas mãos...


Uma na outra - ebulição e calmaria,


silêncio longo e alvoroço breve,


no instante supremo em que trocamos juras


pela linguagem de nossas mãos unidas.




Giselda Medeiros




DESAPROPRIAÇÃO

O Tempo varre o sótão do meu sonho,
limpa o telhado do meu pensamento,
refaz o alpendre branco, onde me ponho
a conversar, à noite, com o vento.

Não ouço nada, além do que deponho,
em voz sofrida, em lúgubre lamento
ao Tempo que, veloz, segue e, medonho,
vai dissipando os sonhos que acalento.

E fico, horas a fio, indiferente
a esse mister de desapropriação
que o Tempo em nossa vida, mudo, faz.

Depois... depois, o que resta na gente
é este vazio - a flor da solidão -
que se abre e não fenece nunca mais...

Giselda Medeiros

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

TOTAL PRESENÇA

Giselda Medeiros

Ouves, acaso, no tanger do vento,

doce murmúrio que, em silêncio, tece?

Escuta, amor, pois é meu pensamento

que te procura, fértil, como a prece.

Sentes, acaso, naquele momento,

em que a manhã de luz se resplandece,

cair sobre teu peito um novo alento?

Sou eu, do amor, a te trazer a messe...

Pois nesse instante, amor, minha presença,

faz-se sentir em todos os lugares,

como teu sol, teu lar e tua crença.

Desperta, abre a janela e o espaço fita,

que eu estarei em tudo o que tocares

em tudo o que pensares, me acredita!

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010






UM CÉU

Ah, como queria ter
no teu esplêndido corpo
um lugar só para mim
onde a música que ouvisse
fosse somente tua voz.
Onde, em tardes sonolentas,
sibilos de amor houvesse.
Onde a ternura varresse
esses estúpidos tédios.
Depois um incêndio sonoro
de beijos, abraços mil
carbonizasse nossa alma.
Nossas cinzas voariam
pela amplidão deste mundo,
pelos espaços ao léu.
E lá, entre astros luzentes,
da lua roubando o mel,
seríamos mais do que amantes,
seríamos mais do que amados...
... seríamos o próprio céu.

Giselda Medeiros
QUERO-TE
Quero-te assim
com essas mãos de adeuses
bordando frios luares
na minha túnica de sonhos.
Quero-te assim
com olhos de andorinha
visualizando a placidez
dos silêncios.
Quero-te assim,
filósofo dos efêmeros abraços,
andarilho, Quixote, Orfeu.
Quero-te assim,
mar revolto
com seus lúcidos queixumes
batendo em minhas praias, insistente,
com a fúria de teu sal.
Quero entoar-te um canto cheio
de tua luz buliçosa,
encher-me as ruas desertas
de teus passo peregrinos.
Quero-te assim como és.
Giselda Medeiros


FOGUEIRA

Mentes...
Não é propriamente o beijo
que te acende a fogueira
dos desejos.
Mas a eletricidade dos olhares
naquele tempo calado
esperado
posto na ânsia dos lábios
e o fogo ardente na carne
vislumbrando o instante supremo
da posse.

Giselda Medeiros

terça-feira, 19 de janeiro de 2010


CANÇÃO DA ESPERA
Passas.
Teu vulto é um oásis
onde quero aprender
o ofício das areias
nas longas noites
em que as estrelas
fiam fios finos
de fluida luz.
Teus passos na tarde
ecoam ainda
em minhas manhãs,
alvacentas e lânguidas,
como o marulho das vagas
que ficaram para trás.
Mas passas,
indiferente e lento,
sobre meus anseios
com mãos enfeitadas de adeuses
a romper em flores de esquecimento.
Giselda Medeiros

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Instabilidade

Vês?
Aquela onda a tecer rendas de espanto,
na areia,
não sou eu.
Eu sou o contorno das espumas
lavrado como escritura
para o abissal exílio dos grãos
de areia.

Minha essência
são esses fragmentos de ausência
retidos na voz dos náufragos,
no desespero das algas e corais
afogados.

Entre ti e mim há sombras
que devoram horas,
que extraviam calendários;
há voos que perderam a estabilidade
e passos esquecidos na estrada.
Somos paisagens que se despedaçam
sob os látegos do tempo.

Em nós, apenas os murmúrios cegos
de um amor espetado
pelos dedos espinhentos do destino.

Somos a ânsia dos tardos andarilhos:
tu, as pegadas, lentas,
irremediavelmente tímidas;
e eu, o porto, a chegada final,
que espera em vão
o assentamento da âncora
dos teus andarilhos passos.

Giselda Medeiros
HOJE E AMANHÃ
Em ti gravita meu sol
que espanta as brumas
da dor.
Em ti habita minha palavra.
Sou teu texto
e sei que te movo a emoção.
Por isso é que canto
e trago, hoje, este poema
porque amanhã
não sei se ainda haverá Poesia.
Hoje sou tua estrela
Sirius, Aldebarã.
Mas, amanhã,
não sei se ainda haverá a Via-Láctea.
Hoje, sou a âncora que te sacia a sede,
mas, amanhã,
não sei se ainda haverá vinho
para a demanda.
Por isso, toma-me inteiramente,
hoje,
porque o amanhã
será como o voo da ave
que nascerá
da solidão da noite.
E quem lhe conhecerá as penas?
Giselda Medeiros

domingo, 17 de janeiro de 2010


QUEM?

Mas, quem ouvirá a minha voz
tão pequena
ante a implapável luz das estrelas?
Quem se assustará com as emoções roubadas
das estátuas frias da praça?
Quem me abrirá as mãos de flor selvagem
sobre meus pulsos mortos?

Quem pousará vivo no meu coração
o pássaro do amor?
Quem???

Giselda Medeiros



DO SILÊNCIO

Se faço uma canção

de madrugadas e luares,

de brisas e de silêncios,

é que te espero o sorriso

na solidão do meu riso,

amarelo e sem vigor,

querendo alçar o seu voo

de Ícaro.

Teu corpo resvala

no silêncio do meu corpo,

metáfora e alegoria

domadas, tão bem urdidas,

desferidas como dardos

no texto de minha vida.

E o silêncio grita indomado

no instante buliçoso

amordaçando o sorriso

no lábio cheio de versos.

Giselda Medeiros



quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

O PÓ DA VIDA

Pedregosos são os caminhos da vida.
Ínvios os lugares de vigília
desde as horas matutinas
ao rosnar exangue dos crepúsculos.
A vida é ilha
cercada de imensas dores.
Se lhe açoitam ventos de alegria,
espreitam-nos segredos insolúveis.
E o pó,
o mesmo que pisamos nas estradas,
com seu tímido olor de mortos,
vitorioso nos espera
em qualquer crepúsculo,
na intemporalidade de seu mister.
Giselda Medeiros

Oh, nesta noite!
nem que seja somente nesta noite
faze tremer em mim
essa ondas turbulentas de teu mar.
Quero sentir-me em teu chão de praia
com o frêmito do teu abraço
e o susto saboroso de teu beijo
em ressaca de verão.
Giselda Medeiros

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

CANÇÃO

Seu coração
É muito ambicioso...
Quer ir além das estrelas.
O meu, amor, quer tão pouco...
quer somente ouvi-lo e vê-lo.
Giselda Medeiros


terça-feira, 12 de janeiro de 2010


CERTEZA

Sei que estarás em mim,
sempre,
como o voo na asa do pássaro
como o azul nas águas do rio,
como a dor - máscara -
na ponta do espinho,
face de Lázaro.

Sei que estarás em mim...
sempre:
Poesia
Aurora
Adeus.
Ou na hora sombria
do beijo do tempo
quando não mais houver
tempo para nada.


Giselda Medeiros

Não te pedirei mais nada.
Se já me amas
e cantas comigo
a doce canção da Poesia
já me basta.
É tempo de semear!


Giselda Medeiros

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010


Sou feita de luas e mistérios,
Trago na alma a solidão dos rios,
As mãos, as tenho em posição de prece
E o olhar perdido nos caminhos...


Giselda Medeiros